terça-feira, 23 de novembro de 2010



"Amanhã é 23
São 8 dias para o fim do mês
Faz tanto tempo
Que eu não te vejo
Queria o seu beijo
Outra vez..."

(George Israel/Paula Toller)

Para tudo, uma data...

Depois que nasceu naquele dia, ela se viu a contar seus dias e condecorá-los no calendário. Cresceu acumulando no diário as datas de seus primeiros feitos. Marcava início e fim de seus diversos ciclos e fases.


Para cada data memorizada, o calendário se rendia aos aniversários de qualquer coisa. “Faz tantos dias, meses, anos de quando aquilo aconteceu”.


Para os momentos alegres, festa. Para as lembranças tristes, um copo de vinho e um brinde à solitária mancha rabiscada no calendário.


Mas nada lhe causava tanta dor quanto às datas mais felizes que, por descuido das coincidências do destino, se transformaram drasticamente em motivos pra se esquecer.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

...


"Ouve-me,
ouve o meu silêncio.
O que falo nunca é o que falo e sim outra coisa.
Capta essa outra coisa de que na verdade falo
porque eu mesma não posso."

(Clarice Lispector)

segunda-feira, 1 de novembro de 2010



Agora não temos mais #ondaverde #ondavermelha #ondaazul... A única onda que realmente importa é a junção das cores da nossa bandeira...

Vamos olhar daqui pra frente com esperança. Vamos fazer nossa parte, nas mínimas oportunidades de sermos verdadeiros cidadãos.

O resultado não é unânime. É democrático. Estava nas regras da caixinha do jogo de tabuleiro. E, como nas brincadeiras dos tempos de criança, a sabedoria se revela no aprendizado de sermos
bons ganhadores e bons perdedores. Nessa disputa cada um escolheu um lado e, de forma legítima, expôs suas maneiras de ora atacar, ora defender. Agora é preciso respeitar a escolha da maioria.

Terminado o período de Eleição somos de novo uma só nação repleta de diferenças e peculiaridades, mas com o tal do desejo que nos une: o bem comum. Sonho que se sonha junto é realidade, diz a canção, né?!

Pois bem. Façamos um trato: vamos utilizar a mesma motivação que tivemos pra discutir, defender, convencer, com tanto afinco no ciberespaço, para contribuir cada vez mais com o nosso Brasilzão...

E, se der, vamos levar esse papo pra vida real, que nos convida todos os dias a exercer - na prática - o empenho de fazer um mundo melhor, repleto de pessoas que buscam melhorar e evoluir, sempre! A começar por nós mesmos.



* Caso alguém pergunte: Meu voto foi para Dilma.

sábado, 3 de julho de 2010

Crônica que Drummond escreveu para o Jornal do Brasil logo após a eliminação da seleção brasileira diante da Itália na Copa do Mundo da Espanha, em 1982.




Perder, ganhar, viver
(Carlos Drummond de Andrade)

Crônica publicada no dia 21 de junho de 1982 no Jornal do Brasil.

Vi gente chorando na rua, quando o juiz apitou o final do jogo perdido; vi homens e mulheres pisando com ódio os plásticos verde-amarelos que até minutos antes eram sagrados; vi bêbados inconsoláveis que já não sabiam por que não achavam consolo na bebida; vi rapazes e moças festejando a derrota para não deixarem de festejar qualquer coisa, pois seus corações estavam programados para a alegria; vi o técnico incansável e teimoso da Seleção xingado de bandido e queimado vivo sob a aparência de um boneco, enquanto o jogador que errara muitas vezes ao chutar em gol era declarado o último dos traidores da Pátria; vi a notícia do suicida do Ceará e dos mortos do coração por motivo do fracasso esportivo; vi a dor dissolvida em uísque escocês da classe média alta e o surdo clamor de desespero dos pequeninos, pela mesma causa; vi o garotão mudar o gênero das palavras, acusando a mina de pé-fria; vi a decepção controlada do Presidente, que se preparava, como torcedor número um do país, para viver o seu grande momento de euforia pessoal e nacional, depois de curtir tantas desilusões de governo; vi os candidatos do partido da situação aturdidos por um malogro que lhes roubava um trunfo poderoso para a campanha eleitoral; vi as oposições divididas, unificadas na mesma perplexidade diante da catástrofe que levará talvez o povo a se desencantar de tudo, inclusive das eleições; vi a aflição dos produtores e vendedores de bandeirinhas, flâmulas e símbolos diversos do esperado e exigido título de campeões do mundo pela quarta vez, e já agora destinados à ironia do lixo; vi a tristeza dos varredores da limpeza pública e dos faxineiros de edifícios, removendo os destroços da esperança; vi tanta coisa, senti tanta coisa nas almas...

Chego à conclusão de que a derrota, para a qual nunca estamos preparados, de tanto não a desejarmos nem a admitirmos previamente, é afinal instrumento de renovação da vida. Tanto quanto a vitória, estabelece o jogo dialético que constitui o próprio modo de estar no mundo. Se uma sucessão de derrotas é arrasadora, também a sucessão constante de vitórias traz consigo o germe de apodrecimento das vontades, a languidez dos estados pós-voluptuosos, que inutiliza o indivíduo e a comunidade atuantes. Perder implica remoção de detritos: começar de novo.

Certamente, fizemos tudo para ganhar esta caprichosa Copa do Mundo. Mas será suficiente fazer tudo, e exigir da sorte um resultado infalível? Não é mais sensato atribuir ao acaso, ao imponderável, até mesmo ao absurdo, um poder de transformação das coisas, capaz de anular os cálculos mais científicos? Se a Seleção fosse à Espanha, terra de castelos míticos, apenas para pegar o caneco e trazê-lo na mala, como propriedade exclusiva e inalienável do Brasil, que mérito haveria nisso? Na realidade, nós fomos lá pelo gosto do incerto, do difícil, da fantasia e do risco, e não para recolher um objeto roubado. A verdade é que não voltamos de mãos vazias porque não trouxemos a taça. Trouxemos alguma coisa boa e palpável, conquista do espírito de competição. Suplantamos quatro seleções igualmente ambiciosas e perdemos para a quinta. A Itália não tinha obrigação de perder para o nosso gênio futebolístico. Em peleja de igual para igual, a sorte não nos contemplou. Paciência, não vamos transformar em desastre nacional o que foi apenas uma experiência, como tantas outras, da volubilidade das coisas.

Perdendo, após o emocionalismo das lágrimas, readquirimos ou adquirimos, na maioria das cabeças) o senso da moderação, do real contraditório, mas rico de possibilidades, a verdadeira dimensão da vida. Não somos invencíveis. Também não somos uns pobres diabos que jamais atingirão a grandeza, este valor tão relativo, com tendência a evaporar-se.

Eu gostaria de passar a mão na cabeça de Telê Santana e de seus jogadores, reservas e reservas de reservas, como Roberto Dinamite, o viajante não utilizado, e dizer-lhes, com esse gesto, o que em palavras seria enfático e meio bobo. Mas o gesto vale por tudo, e bem o compreendemos em sua doçura solidária. Ora, o Telê! Ora, os atletas! Ora, a sorte! A Copa do Mundo de 82 acabou para nós, mas o mundo não acabou. Nem o Brasil, com suas dores e bens. E há um lindo sol lá fora, o sol de nós todos.

E agora, amigos torcedores, que tal a gente começar a trabalhar, que o ano já está na segunda metade?

terça-feira, 29 de junho de 2010



Na verdade, eu acho que tem muito de mim por aqui.
Essa é a trava. Falta um pouco de espaço. De jeito.
Preciso de um tempo sem me ler nessas linhas.
Me leve para outros sonhos...
Me ensine novas maneiras de contar histórias que não são minhas.
Mesmo que tão minhas elas se tornem.
Mesmo que tão minhas elas realmente sejam.



"(...)Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço. (...)"
(Procura da Poesia - Carlos Drummond de Andrade)






*Foto tirada numa aula de vôo rumo ao infinito em mim.
* Texto editado.

terça-feira, 22 de junho de 2010

"É tão estranho... Os bons morrem jovens. Assim parece ser quando me lembro de você. Que acabou indo embora... Cedo demais."  
(Love In The Afternoon - Legião Urbana)



Pedro Gonçalves da Costa tinha 16 anos quando um motorista, dirigindo sob efeito do álcool e em alta velocidade, lhe tirou a vida no ano passado. Era por volta de 07h15 da manhã quando ele e seus amigos atravessavam a W3 Sul em direção ao colégio Setor Oeste. Pedro estava no 2º grau e se preparava para fazer o vestibular.

Não. Eu não tive contato com o Pedro. Mas nossa história se cruza pelo fato dele ser filho de um querido amigo do meu pai. Quando recebi a notícia de sua morte senti uma imensa tristeza pelo fato de um jovem ter morrido assim tão cedo. Pensei na dor de se enterrar um filho. Pensei na dor de deixar incompletos os tantos sonhos que ele deveria ter.

Na semana passada ele completaria 18 anos. Assim como meu irmão completou esse mês. E meu pai me falou do convite feito pelo tio Franklin, pai de Pedro, para o lançamento do livro do seu filho. Fiquei surpresa e imaginei que fosse algo feito pelo pai registrando a história de seu filho. Mas foi algo mais...

Meses depois da morte de seu filho, tio Franklin encontrou entre suas coisas centenas de versos que  revelaram o poeta Pedro. Ele escrevia, em silêncio,  sobre a sua maneira de olhar a vida e as coisas que aconteciam ao seu redor. Quando eu li não acreditei que aquele menino, tão novo, tão tímido, pudesse ter tamanha sensibilidade diante do mundo.

Lágrimas não cessavam de cair dos meus olhos quando percebi a força de sua família ao ver seu filho tão vivo em cada um daqueles versos. E eu, que não tive contato com ele, me vi totalmente encantada com aquele livro em minhas mãos, com tantas coisas para perceber e entender, a partir do olhar de Pedro Gonçalves da Costa. Uma estrela solidária, que brilha no céu pra sempre.

A vida é azul

Atravesso rios e pontes,
percorro montes e vales,
alcanço grutas e mares,
só pra te dizer, meu amor,
que a vida é azul. 

Transformo meu grito em eco,
mudo meu pranto em sorriso,
revejo mentira em verdade,
só pra te dizer, meu amor,
que a vida é azul. 

As coisas que nos parecem nocivas,
por mais que possam nos machucar,
e nos deixar bem entristecidos,
sempre haverá motivos,
pra te dizer, meu amor,
que a vida é azul. 

(Pedro Gonçalves da Costa)

quinta-feira, 20 de maio de 2010


"Já que não tinha sono, foi à cozinha esquentar o café. Pôs açúcar demais na xícara e o café ficou horrível. Isto levou-a a uma realidade mais cotidiana. Descansou um pouco de ser. Ouvia o barulho das ondas do mar de Ipanema se quebrando na praia. Era uma noite diferente, porque enquanto Lóri pensava e duvidava, os outros estavam dormindo. Foi à janela, olhou a rua com seus raros postes de iluminação e o cheiro mais forte do mar. Estava escuro para Lóri. Tão escuro. Pensou em diversas coisas: estavam dormindo ou se divertindo. Algumas estavam tomando uísque. Seu café então se transformou em mais adocicado ainda, em mais impossível ainda. E a escuridão dos solitários se tornou tão maior. Estava caindo numa tristeza sem dor. Não era mau. Fazia parte, com certeza. No dia seguinte provavelmente teria alguma alegria, também sem grandes êxtases, só um pouco de alegria, e isto também não será mau. Era assim que ela tentava compactuar com a mediocridade de viver."


Trecho do livro “Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres” – Clarice Lispector

sexta-feira, 14 de maio de 2010


Ah...vida real! Como é que eu troco de canal? 
(Engenheiros do Hawaii)

Sempre tento. Juro que tento.
Eu tento entrar no blog e clicar no botão de nova postagem. E nela começar a escrever em 1ª pessoa.
Eu tento. Tento digitar de maneira direta, sem rodeios, aquilo que eu penso e sinto.
Só tento. Mas nunca consigo.
Por isso continuam os textos vagos que servem de fotografia das minhas histórias. Mas que se atropelam e se espalham a cada post. Sem mais pertencerem ao passado, presente ou futuro. Se entregando ao tempo próprio dos meus rabiscos virtuais que insistem em somente contar minhas doces dores, meus amados amores e aquele tantão de sonhos. Cada qual com o seu calendário. Real ou Imaginário. Dela - eu. Pra mim -ela.
Mas continuarei tentando. Mesmo assim.

segunda-feira, 10 de maio de 2010



“Se a paixão fosse realmente um bálsamo, o mundo na pareceria tão equivocado...” (Renato Russo)

A paixão é combustível. É pele. Cheiro. É alta voltagem. É viciante. É mágica. É a melhor liga entre os corpos. O mais poderoso imã. A paixão é o frisson, o furor, a tensão, o tesão. É a perda do equilíbrio e do prumo. A paixão é real e surreal ao mesmo tempo.

Mas a paixão pode cegar, enganar. Ela precisa estar lado a lado com o discernimento, a prudência e o autocontrole. Pois acredito que às vezes conceituamos a paixão como sendo amor. E pior: um amor idealizado. E o narcisismo é a marca, por exemplo, de nossas tantas frustrações. Reflexo de nossas buscas ou de nós mesmos no outro. A paixão é carregada do desejo da satisfação no preenchimento das nossas lacunas, daquilo que nos falta.

Acho que também tudo é culpa do amor romântico e lúdico que é impregnado na nossa cultura. Nos filmes, novelas, canções. Nas nossas experiências vividas onde achamos que a intensidade de uma paixão é ou foi o amor. A subjetividade tomou conta das relações. Eu me apaixono por uma série de características subjetivas no outro. Pelas coisas que completam a Jaqueline que eu acho que estão no outro. E se, aos poucos, eu acho que elas não me satisfazem, não existe mais o “amor”. Tudo isso vale para a visão do outro em relação a mim.

Por não sabermos conceituar e perceber a paixão e todos seus impactos, passamos a não compreender da mesma forma a solidão. Pois ela se torna geralmente proporcional ao fracasso daquilo que a gente vislumbra com o “estar apaixonado”.


“Ainda encontro a fórmula do amor...” (Leoni e Léo Jaime)

Aqui nasce meu maior exercício ultimamente. A cura do meu coração a partir de uma nova forma de definir o amor.

O tal amor é essência, entrelinha, pano de fundo, enredo. O amor é exercício e muito suor. É luta. É diariamente. O amor pode até vir timidamente lado a lado com a paixão, mas será sempre o que resiste, o que persiste, o que passa a existir. O amor é visualizar a forte costura entre duas pessoas. É ir além das expectativas egoístas, dos limites e defeitos, meus e do outro. É ternura e candura. É amadurecimento dos diálogos e dos abraços. É o olhar poliglota capaz de ler e entender todas as falas do outro, até mesmo as mais silenciosas.

Amor é quando você percebe o quanto lhe custaria amar aquela pessoa se ali, dentro de ti, não existisse aquela força inexplicável que o faz amar e amar e amar. Cada vez mais. Amor não é grude, é presença. E se fazer presente nem sempre é algo físico. É não impor condição alguma. O amor é um morrer pelo outro. E sempre. Não de morte morrida. Mas sabendo ceder, perder, reconhecer, pelo o outro. O amor parece submisso, percebendo-o assim, mas é mais libertador que imaginamos.

O amor é fonte infinita. É um consumir-se num gesto contínuo de doação, sem se esgotar. Amor de pai e mãe, de irmãos... Na maioria das vezes é um amor que não se cansa. A gente cansa dos problemas, de ver quem amamos da nossa família errar, mas não nos cansamos de amá-los e vice e versa.

Pois pra mim o amor é eterno. O que acaba, por vezes, não é o amor. É a nossa disposição de amar que enfraquece. Nossa capacidade de frutificar o amor que se esvai. Muitas vezes nós é que entregamos os pontos. Desistimos do outro. Ou até de nós mesmos.

Paixão e Amor sempre estarão atrelados a conceitos. E conceitos se emaranham com valores, crenças, nossas experiências. Algo realmente pessoal. E é assim que eu vou dando nome aos meus bois. Ao que realmente é amor e o que é minha construção sobre ele. Separando minha confusão emocional e entendendo que todos nós, homens e mulheres, estamos aprendendo a interpretar e viver o mesmo amor. Isso quer dizer que minhas relações serão sempre baseadas ou amadurecidas de acordo com a fase de percepção de cada um - minha e do outro -, no momento em que passar a existir o encontro e a vontade de se trocar essas percepções.

Esse é o tal amor que eu ando restaurando dentro de mim. Encarando-o como um rio, lindo e límpido, onde eu navego e mergulho profundamente, sabendo que é preciso saber nadar, remar, criar artifícios para continuar nele.

Para seguir amando.
Sempre.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

“O nosso amor não vai olhar para trás. Desencantar, nem ser tema de livro. A vida inteira eu quis um verso simples pra transformar o que eu digo. Rimas fáceis, calafrios. Fure o dedo, faz um pacto comigo. Num segundo teu no meu... Por um segundo mais feliz!” (Mais Feliz - Dé/ Bebel Gilberto/ Cazuza)


Depois daquele papo parei para refletir que um bom filme pra mim está diretamente ligado ao mistério das oscilações emocionais. Momentos de tensão, roteiro interessante, expectativa do final. O filme precisa fascinar, fisgar a atenção de alguma maneira. Vale emocionar, ousar , causar indignações, empatia e até mesmo contradições com o que sentimos, pensamos e agimos.

Nossa história cinematográfica também é assim. Somos mutantes de nós mesmos. Cada um com uma bagagem de emoção. Com um olhar especial sobre a vida e tudo mais que nos cerca. Nós e nossas maneiras de esperar pelo futuro. Expectativas de bolso e de alma. As nossas diferenças, então, se rendem ao fato de estarmos unidos numa mesma cena.

Somos personagens reais que decoram seus textos secretos e não sabem como funciona o roteiro como um todo. Só descobrimos aos poucos quando cada um entrega de bandeja sua fala em direção ao outro. E eu só conheço o que você mostra. E brinco de supor o que se passa por trás do seu ato de mostrar. É ali que, de fato, faço a linha imaginária do limite até onde eu posso ir. Depois desse ponto é você e seu papel.

Meu texto é solto nas páginas em branco e minhas falas escorrem por minha boca sem que eu consiga prendê-las. Mesmo assim decoro cada uma delas e repito, ecôo, lanço por diversas vezes em nossa cena. Mas há de ter um preço. Um arrependimento arredio tira o decoro das verdades que profiro. E as palavras se transformam em algo comum , perdidas no making of de nós dois.

E eu sinceramente não sei aonde chega a parte bonita que eu mostro a você. Não sei como você assiste a esse filme. Não sei se faz seu gênero ou se a minha atuação lhe agrada. Mas o que você me mostra é o que eu assisto, gravo e acredito. Seu texto vira poesia em mim. Decoro suas falas e dou a elas a mesma beleza com que enfeito as minhas.

Mas nesse ensaio dependo de suas deixas para que meu texto, por mais belo que seja, possa fazer algum sentido nesse roteiro de amor.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

"Cada canção de amor abre a ferida, não vê fim. Cada fração da dor, agora é chuva, cai em mim. Mas tudo vai passar, como tudo passará." (Amor Em Vão - Os Paralamas Do Sucesso)


Quando você me ensinou a sonhar acordada nem me lembrei de questionar quanto tempo eu tinha de sonho.
O vento pulava a janela e deixava as cortinas soltas no trilho.
A luz do sol queria me arder, creio eu, pois não sabia de onde vinha tanto calor em mim.
E quando você me ensinou a sonhar nem me lembrei de perguntar quanto tempo eu tinha de sonho.
Se nas notas da sua canção o que me importava era a melodia que chegava ao meu coração.
Se no seu jeans rasgado o que me importava era o seu jeito de andar.
Se na sua voz rouca o que me importava era o meu nome com sabor de doce...
Se com tudo mais que me importava eu me preocupasse apenas em questionar "quanto tempo eu ainda tinha de sonho", deixaria de conhecer o gosto dos seus beijos ou não me perderia no brilho do seu olhar...

Quando você me ensinou a sonhar eu aprendi a te amar.

Mas não tive ninguém pra me ensinar o que fazer depois que passasse o tempo que eu tinha de sonho.

Hoje, como um recorte velho de jornal, eu me lembro de você. Hoje como a sombra de uma árvore, eu me lembro de você. Hoje seu nome está naquele estojo no fim da gaveta onde guardo as contas de luz que já foram pagas. Hoje você é o açúcar que já não adoça como antes. Mas ainda é aquele calo no pé. Aquele velho incomodar dos mosquitos na época de chuva.

(Sempre que eu me decepciono com aquelas novas histórias que eu tentei ensaiar pra darem certo, eu me lembro de você. Não por que eu queira sofrer novamente, mas por que na estante você tem uma plaquinha de "modelo ideal". Mas aí, vem aquela onda de sofrimento velho e batido que eu me lembro já ter superado em algum momento da vida. E percebo que tudo isso é culpa do medo da dor. E assim, me dói o medo de doer outra vez.)

Hoje você é uma espécie de inquilino que não paga o aluguel, mas ainda ocupa o espaço. O espaço de tempo do amor que eu não tinha ao acordar.

"Nada a temer, senão o correr da luta. Nada a fazer, senão esquecer o medo. Abrir o peito à força numa procura. Fugir das armadilhas da mata escura... Longe se vai, sonhando demais, mas onde se chega assim? Vou descobrir o que me faz sentir: Eu caçador de mim. " (Caçador de Mim - Luiz Carlos Sá - Sérgio Magrão)



Como vocês podem observar, ela está em cima da linha.
A linha é reta, prática.
A linha é capaz de levá-la de um ponto a outro.
Mas ela está em cima da linha.
E o estar "em cima da linha" conclui muita coisa. Principalmente desse ângulo que eu a enxergo.
Eu sei que ela até tenta dar uns passos. Para frente. Para trás. Mas sair da linha? Ah! Isso ela não faz.
É tão mais cômodo estar ali. Não tem risco. Não tem medo. Não tem dúvida. É só estar ali e dar uns passos. Para frente. Para trás.
Mas a pergunta é: De que ponto ela quer sair? Em que ponto ela quer chegar? Será essa a linha certa?
Ela olha ao redor e a geometria seduz. Desde as paralelas até outras formas, outros pontos, outras linhas que não são retas. Que tal uma curva? Que tal um outro plano cartesiano?
Que tal o menos prático, mas que aguce um pouco mais a sua inteligência?
Ela está em cima da linha e precisa unir os pontos, aplicar fórmulas pra resolver sua matemática.
E sem a ajuda do sr. Pitágoras.
Ela sente medo. Sair da sua lógica a faz retrair.
E o que ela faz é curvar essa linha e andar em círculos.
E realmente o que ela não queria era fugir da exatidão.
Mas apenas buscar a sua própria geometria.


Preciso sair contra o vento. Não quero deixar pista. Não quero levar na bagagem nem passado, nem presente. Não quero saber meu nome, muito menos sobrenome... Quero novos disfarces.... Quero um outro lugar... Quero montar um velho quebra-cabeça com novas peças... Preciso recomeçar de um ponto em que eu não parei!