quinta-feira, 20 de maio de 2010


"Já que não tinha sono, foi à cozinha esquentar o café. Pôs açúcar demais na xícara e o café ficou horrível. Isto levou-a a uma realidade mais cotidiana. Descansou um pouco de ser. Ouvia o barulho das ondas do mar de Ipanema se quebrando na praia. Era uma noite diferente, porque enquanto Lóri pensava e duvidava, os outros estavam dormindo. Foi à janela, olhou a rua com seus raros postes de iluminação e o cheiro mais forte do mar. Estava escuro para Lóri. Tão escuro. Pensou em diversas coisas: estavam dormindo ou se divertindo. Algumas estavam tomando uísque. Seu café então se transformou em mais adocicado ainda, em mais impossível ainda. E a escuridão dos solitários se tornou tão maior. Estava caindo numa tristeza sem dor. Não era mau. Fazia parte, com certeza. No dia seguinte provavelmente teria alguma alegria, também sem grandes êxtases, só um pouco de alegria, e isto também não será mau. Era assim que ela tentava compactuar com a mediocridade de viver."


Trecho do livro “Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres” – Clarice Lispector

sexta-feira, 14 de maio de 2010


Ah...vida real! Como é que eu troco de canal? 
(Engenheiros do Hawaii)

Sempre tento. Juro que tento.
Eu tento entrar no blog e clicar no botão de nova postagem. E nela começar a escrever em 1ª pessoa.
Eu tento. Tento digitar de maneira direta, sem rodeios, aquilo que eu penso e sinto.
Só tento. Mas nunca consigo.
Por isso continuam os textos vagos que servem de fotografia das minhas histórias. Mas que se atropelam e se espalham a cada post. Sem mais pertencerem ao passado, presente ou futuro. Se entregando ao tempo próprio dos meus rabiscos virtuais que insistem em somente contar minhas doces dores, meus amados amores e aquele tantão de sonhos. Cada qual com o seu calendário. Real ou Imaginário. Dela - eu. Pra mim -ela.
Mas continuarei tentando. Mesmo assim.

segunda-feira, 10 de maio de 2010



“Se a paixão fosse realmente um bálsamo, o mundo na pareceria tão equivocado...” (Renato Russo)

A paixão é combustível. É pele. Cheiro. É alta voltagem. É viciante. É mágica. É a melhor liga entre os corpos. O mais poderoso imã. A paixão é o frisson, o furor, a tensão, o tesão. É a perda do equilíbrio e do prumo. A paixão é real e surreal ao mesmo tempo.

Mas a paixão pode cegar, enganar. Ela precisa estar lado a lado com o discernimento, a prudência e o autocontrole. Pois acredito que às vezes conceituamos a paixão como sendo amor. E pior: um amor idealizado. E o narcisismo é a marca, por exemplo, de nossas tantas frustrações. Reflexo de nossas buscas ou de nós mesmos no outro. A paixão é carregada do desejo da satisfação no preenchimento das nossas lacunas, daquilo que nos falta.

Acho que também tudo é culpa do amor romântico e lúdico que é impregnado na nossa cultura. Nos filmes, novelas, canções. Nas nossas experiências vividas onde achamos que a intensidade de uma paixão é ou foi o amor. A subjetividade tomou conta das relações. Eu me apaixono por uma série de características subjetivas no outro. Pelas coisas que completam a Jaqueline que eu acho que estão no outro. E se, aos poucos, eu acho que elas não me satisfazem, não existe mais o “amor”. Tudo isso vale para a visão do outro em relação a mim.

Por não sabermos conceituar e perceber a paixão e todos seus impactos, passamos a não compreender da mesma forma a solidão. Pois ela se torna geralmente proporcional ao fracasso daquilo que a gente vislumbra com o “estar apaixonado”.


“Ainda encontro a fórmula do amor...” (Leoni e Léo Jaime)

Aqui nasce meu maior exercício ultimamente. A cura do meu coração a partir de uma nova forma de definir o amor.

O tal amor é essência, entrelinha, pano de fundo, enredo. O amor é exercício e muito suor. É luta. É diariamente. O amor pode até vir timidamente lado a lado com a paixão, mas será sempre o que resiste, o que persiste, o que passa a existir. O amor é visualizar a forte costura entre duas pessoas. É ir além das expectativas egoístas, dos limites e defeitos, meus e do outro. É ternura e candura. É amadurecimento dos diálogos e dos abraços. É o olhar poliglota capaz de ler e entender todas as falas do outro, até mesmo as mais silenciosas.

Amor é quando você percebe o quanto lhe custaria amar aquela pessoa se ali, dentro de ti, não existisse aquela força inexplicável que o faz amar e amar e amar. Cada vez mais. Amor não é grude, é presença. E se fazer presente nem sempre é algo físico. É não impor condição alguma. O amor é um morrer pelo outro. E sempre. Não de morte morrida. Mas sabendo ceder, perder, reconhecer, pelo o outro. O amor parece submisso, percebendo-o assim, mas é mais libertador que imaginamos.

O amor é fonte infinita. É um consumir-se num gesto contínuo de doação, sem se esgotar. Amor de pai e mãe, de irmãos... Na maioria das vezes é um amor que não se cansa. A gente cansa dos problemas, de ver quem amamos da nossa família errar, mas não nos cansamos de amá-los e vice e versa.

Pois pra mim o amor é eterno. O que acaba, por vezes, não é o amor. É a nossa disposição de amar que enfraquece. Nossa capacidade de frutificar o amor que se esvai. Muitas vezes nós é que entregamos os pontos. Desistimos do outro. Ou até de nós mesmos.

Paixão e Amor sempre estarão atrelados a conceitos. E conceitos se emaranham com valores, crenças, nossas experiências. Algo realmente pessoal. E é assim que eu vou dando nome aos meus bois. Ao que realmente é amor e o que é minha construção sobre ele. Separando minha confusão emocional e entendendo que todos nós, homens e mulheres, estamos aprendendo a interpretar e viver o mesmo amor. Isso quer dizer que minhas relações serão sempre baseadas ou amadurecidas de acordo com a fase de percepção de cada um - minha e do outro -, no momento em que passar a existir o encontro e a vontade de se trocar essas percepções.

Esse é o tal amor que eu ando restaurando dentro de mim. Encarando-o como um rio, lindo e límpido, onde eu navego e mergulho profundamente, sabendo que é preciso saber nadar, remar, criar artifícios para continuar nele.

Para seguir amando.
Sempre.